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Ciência | 22 de Março de 2018
A biodiversidade da Amazônia aplicada na produção de bioetanol de segunda geração

Enzima extraída de microrganismos de lago amazônico demonstra potencial no processo industrial de produção de biocombustíveis

O crescente entendimento de que a elevação na temperatura média do planeta tem sido causada pela ação humana intensificou nos últimos anos a busca por fontes de energia limpa, renovável e barata. Uma dessas fontes alternativas são os biocombustíveis da chamada segunda geração, produzidos a partir dos resíduos da agricultura, como palha e bagaço de cana, que são compostos principalmente por celulose. A produção do etanol de segunda geração, por exemplo, passa pela quebra dessa celulose em açucares mais simples com a utilização de diversas enzimas, com posterior fermentação em etanol.

Dentre as enzimas necessárias para este processo, as chamadas endo- e exoglucanases agem diretamente na celulose produzindo celobiose, um dissacarídeo composto por duas moléculas de glicose. A seguir, a celobiose precisa ser quebrada em glicose por enzimas $\beta$-glucosidases. No entanto, essas substâncias têm sua ação inibida pela presença de seus próprios produtos. Há, assim, uma demanda crescente por novas enzimas que não só resistam à inibição, mas também tenham sua atividade ótima nas faixas de temperatura e pH adequadas à produção industrial.

A região amazônica abriga a maior bacia hidrográfica e uma das maiores biodiversidades do mundo. A investigação dessa grande variedade de organismos pode levar a descoberta de diversas substâncias com aplicações biotecnológicas.  Em particular, microrganismos presentes em rios e lagos da região produzem enzimas que, capazes de decompor restos vegetais, podem ser úteis na produção dos biocombustíveis de segunda geração.

Estrutura do monômero da enzima AmBgl-LP com os resíduos catalíticos representados com os átomos de carbono em amarelo.

Em estudo recente [1], pesquisadores brasileiros identificaram uma nova enzima $\beta$-glucosidase, a partir da análise de microrganismos presentes no Lago Poraquê, adjacente ao Rio Solimões. As Linhas de Luz MX2 e SAXS1 do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) foram utilizadas na caracterização estrutural da enzima, chamada AmBgl-LP, que demonstrou ser similar a outras $\beta$-glucosidades da família GH1. No entanto, de forma incomum entre as enzimas desse grupo, AmBgl-LP se dimeriza (se combina em pares) quando em solução.

O grupo demonstrou também que a enzima AmBgl-LP possui características compatíveis com o processo industrial de Sacarificação e Fermentação Simultâneas (SSF). Neste importante processo para a redução de custos no setor sucroalcooleiro, coquetéis enzimáticos quebram a celulose em açucares de forma simultânea à ação de leveduras em fermentar os açucares em etanol.

Esta é a primeira vez que uma enzima de uma amostra de lago amazônico é isolada, produzida e caracterizada por metagenômica, que é o estudo do material genético obtido diretamente de amostras ambientais contendo uma grande variedade de organismos. Segundo os pesquisadores, essa abordagem se mostrou valiosa para a busca de novas enzimas para a quebra da celulose em processos industriais, além de contribuir para a compreensão da diversidade estrutural das enzimas da família GH1.

O estudo foi fruto de colaboração entre pesquisadores do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio) e do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) – ambos parte do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) – além de pesquisadores da Universidade de São Paulo, Universidade Federal de São Carlos e Petrobrás. Além das Linhas de Luz do LNLS, também foram utilizadas instalações abertas do LNBio.

Fonte: [1] Danyelle Toyama, Mariana Abrahão Bueno de Morais, Felipe Cardoso Ramos, Letícia Maria Zanphorlin, Celisa Caldana Costa Tonoli, Augusto Furio Balula, Fernando Pellon de Miranda, Vitor Medeiros Almeida, Sandro Roberto Marana, Roberto Ruller, Mario Tyago Murakami, Flavio Henrique-Silva, A novel β-glucosidase isolated from the microbial metagenome of Lake Poraquê (Amazon, Brazil), Biochimica et Biophysica Acta (BBA) – Proteins and Proteomics, 2018. DOI: 10.1016/j.bbapap.2018.02.001

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